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Foto do escritorRaissa Ferreira

Tribeca 2024 | Beacon

Em thriller minimalista, Roxy Shih marca bastante sua referência e se pauta pela dúvida para jogar com a percepção de vilania da trama

Beacon Roxy Shih

Um farol isolado em uma ilha remota, duas pessoas presas no local com clima instável e a ameaça do mito da sereia rondando suas mentes, eu poderia estar falando do filme de Robert Eggers mas a diretora taiwanesa-americana Roxy Shih escolhe outra variação da palavra para dar título a sua obra que conversa totalmente com a referência de 2019. Excluindo as cenas em que uma intervenção gráfica maior é necessária para dar dimensão ao mar e aos arredores da ilha, Beacon trabalha com pouco, dois atores, ambientes fechados e a tensão que se dá nesse processo. Começando pela jovem Emily (Julia Goldani Telles) sozinha em seu pequeno barco, longe de tecnologias e outros recursos modernos, até seu acidente que a leva ao encontro de Ismael (Demián Bichir), o guardião do farol, a encenação se limita sempre a poucos elementos, focando nas pessoas e deixando o horizonte embaçado, como se a ilha fosse um pedaço geográfico totalmente separado do mundo. Para construir a tensão de seu thriller, Roxy Shih destaca a dúvida nos mantendo exclusivamente no ponto de vista de Emily, jamais dando nenhuma pista do que verdadeiramente acontece pelo lado de Ismael. Assim, sabemos tanto quanto a jovem o que aconteceu em seu acidente, como ela foi parar lá e quais são as intenções reais desse homem. A primeira dúvida é óbvia e não exige muito, uma mulher sozinha no meio do nada com um homem e, para que essa se torne mais complexa, Ismael passa a entregar a Emily todas as ferramentas que possam representar alguma confiança (arma, chave, informações, seja o que for), as boas atitudes do homem começam a beirar o limite entre a honestidade e o perigo disfarçado. 


Por boa parte do tempo é nesse caminho que Beacon nos leva, não existem ameaças efetivas além do questionamento, a tensão se forma ao redor da expectativa de que algo será revelado sobre Ismael e finalmente um ataque acontecerá. Assim, passa a se tornar esperado, deseja-se que esse homem seja realmente um vilão, a peça maligna que dará sentido ao suspense, caso contrário, estamos apenas observando duas pessoas isoladas aguardando resgate. O filme então brinca com Emily e, consequentemente, com o espectador. Dá a confirmação que Ismael está a enganando e depois vem sua justificativa, não há ameaça mais. A jovem busca tanto um atestado das más intenções do guardião do farol que todo e qualquer sinal funciona como combustível para sua defesa imediata. Ela age impulsivamente, sempre aguardando o momento em que poderá atirar, golpear ou amarrar esse homem pois encontrou o aval necessário. Essa lenta progressão da loucura da garota se mistura a momentos em que ela se apoia no homem para ter algum conforto, se aproxima emocionalmente dele e por vezes, até entrega confiança. Nessa dualidade de sentimentos, na dúvida enlouquecedora, muitas sequências se assemelham a Robert Pattinson e Willem Dafoe bebendo e brigando juntos no delírio sem cores de O Farol. Pouco se vê de algo muito original nesse sentido, como se a referência lhe fosse uma base bastante usada sem trazer alguma visão própria, daí até mesmo a mística ao redor das sereias remete a essa movimentação.


O curioso é que o filme flerta com um body horror ao pincelar a ideia de Emily se transformando em uma sereia, com um pedaço ferido de seu corpo criando escamas e posteriormente, adicionando guelras e outros elementos em sua pele. Algo muito utilizado por diretoras no cinema de terror, usar a estrutura corporal feminina se rompendo para dar vida a um monstro nascendo por dentro, começando aos poucos, no incômodo de um machucado que coça e se abre, revelando algo orgânico ou até metálico, porém, pouco disso é explorado por Roxy Shih. Essa transformação é utilizada mais para jogar com as expectativas de vilania, já que a obra vai nesse caminho do questionamento se Ismael é uma ameaça para a mulher e aos poucos, compreendemos que ela mesma é essa ameaça, até a confirmação final. 


Dessa forma, Beacon - único filme da mostra de horror, Tribeca Midnight, disponível na cobertura online - vai por escolhas minimalistas, uma tensão criada entre duas pessoas e somente o que suas mentes podem construir, se revelando um filme simples em que até a fantasia tem pouco espaço de fato. Somando tudo isso a uma comparação inevitável com outro longa de trama similar, faz pouco além do genérico, em que o suspense trabalha muito a seu favor, instigando a descoberta da revelação além da dúvida, mas deixa qualquer elemento mais interessante, e que poderia complementar uma visão mais autêntica da diretora, incompleto, pois vê necessidade em focar no que é simples e resolvível de forma racional. 



 

Nota da crítica:

3/5


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