Em esforço de retratar a cultura dos artistas em Maputo, o colombiano Carlos Vargas apresenta filme amador com debates truncados
A arte muito vistosa que ilustra o pôster de Era Oculta (Hidden Era) reflete um pouco do trabalho dos personagens que estão retratados no filme, mas a embalagem, a ideia, parece mais bem estabelecida do que o produto final consegue ser. Um dos objetivos principais, acompanhar a jornada do pintor Phambi que sofre para pagar as contas e sustentar a educação do pequeno filho, se desenha em uma obra que busca respirar a cultura dos ambientes de Maputo. Dessa forma, o protagonista está em constante movimento, seja na caçamba de caminhonetes se deslocando entre lugares, momentos em que a câmera sempre abre bastante seus planos para valorizar o urbano e a ponte que carrega o nome da cidade, ou andando de encontro a encontro com seus quadros em mãos, tentando finalizar suas pinturas ou as vender para, assim, concluir o primeiro objetivo. Nesse meio, as modelos que ilustram seus quadros apresentam debates feministas e os colegas artistas servem de observação desse núcleo cultural e Rastafari, mas o filme sofre para conduzir qualquer conversa que seja. Pela captação do som, é bastante difícil escutar muitos dos personagens que falam baixíssimo enquanto os sons dos ambientes prevalecem, além disso, todos eles parecem estar numa mesma frequência muito pacata, todos extremamente calmos e relaxados, o que deixa qualquer frase que digam arrastada.
O amadorismo do filme destaca o texto muito pobre e assim, os diálogos estão sempre se cortando, alguém diz algo e a outra pessoa responde encerrando imediatamente o assunto, logo, o feminismo, problemas da classe artística e outras pautas levantadas nunca vão além de umas poucas palavras trocadas. É comum que Phambi se desloque pela cidade em um grande esforço para simplesmente ouvir uma frase e a acatar rapidamente. Ele pede um conselho a seu mestre, outro pintor mais experiente, que mora afastado do centro urbano da cidade. Ao chegar, o homem apenas diz a ele que deve trabalhar mais e assim, depois de 1 minuto de papo, Phambi vai embora com essa informação em mente. Com o mesmo vazio narrativo, as modelos falam de feminismo, se limitando a falas jogadas e uma manifestação de rua no final que une mulheres para erguer o protagonista e repetir a mesma frase muitas vezes. Parece um delírio, mas as diferentes formas que Carlos Vargas tenta aplicar em seu trabalho sempre esbarram em um amadorismo que complica demais o resultado final, e as belas imagens de Maputo, ou dos personagens, não conseguem exprimir sozinhas a luta dessas pessoas para viver de arte.
O pequeno filho de Phambi constantemente cobra ao pai o dinheiro da escola, e ele continua a trabalhar em busca disso, porém o ritmo de ação de todos no filme chega a um marasmo tão grande que é impossível o alinhar ao senso de urgência da situação. O pintor leva um quadro, depois dois, até que finalmente chega ao número certo de três quadros que a compradora busca, o esforço é muito para pouquíssima energia empregada pelos personagens, como se a condução de Vargas estipulasse que todos devem parecer chapados e despreocupados o tempo todo, embora seu texto fale de questões que pedem certa energia e profundidade. Vê-se por essa e outras obras que retratam Maputo que existe tanto a se explorar, daí são justamente as cenas silenciosas em que Phambi passa de um ponto a outro pela cidade, carregando seus quadros ou observando as obras finalizadas, que fica claro que a necessidade de injetar discursos mais sérios e atuais sem maior conhecimento de como o fazer, prejudica muito um trabalho que transita nos aspectos urbanos e culturais de uma classe que ali vive e tenta sobreviver com sua arte.
Nota da crítica:
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